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Já aprovada desde dezembro de 2021, Tromectomia Mecânica ainda depende de aval do Ministério da Saúde. Audiência pública vai debater melhorias no SUS a casos de AVC
Em novembro de 2010, aos 65 anos, minha mãe, Noêmia Vicente Macedo, faleceu de complicações de um grave Acidente Vascular Cerebral (AVC) isquêmico que lhe tirou a fala (afasia) e os movimentos do braço e perna direitos (hemiplegia). Acabava a luta que durou sete anos, entre idas e vindas ao hospital, muitas vezes direto no CTI. A situação poderia ter sido diferente se ela tivesse recebido, nas primeiras quatro ou cinco horas após sofrer o AVCi, um medicamento chamado trombolítico. Mas, infelizmente, no Hospital São José do Avaí, em Itaperuna (RJ), informaram que ela já chegou tarde para receber tal terapia.
Passados quase 13 anos desde sua morte, hoje, recebemos na redação de ViDA & Ação uma excelente notícia que poderia ter poupado a vida da minha mãe e de muitas pessoas que sofrem AVCi ou, pelo menos, atenuar as sequelas e danos sofridos por essa doença tão cruel e incapacitante. E o melhor, de graça pelo Sistema Único de Saúde (SUS). A novidade se chama Trombectomia Mecânica (TM). uma terapia que aumenta em até três vezes as chances de pacientes com AVC isquêmico ficarem com pouca ou nenhuma sequela, conforme aponta o estudo Resilient.
Minimamente invasiva, a TM complementa a trombólise, única opção até então disponível na rede pública de saúde, e nem sempre eficiente para os casos mais graves do AVCi. Além de segura e eficaz, uma das grandes vantagens da Trombectomia Mecânica é que pode ser utilizada até 24 horas após os primeiros sintomas do AVC com sucesso. Já outras formas de tratamento, como os trombolíticos, têm uma janela restrita de indicação e sucesso somente até 4,5 horas depois das manifestações iniciais da doença.
“Estamos falando de uma conquista de valor inquestionável para uma doença cujos sintomas nem sempre são notados em curto espaço de tempo, bem como existem atrasos na busca imediata pelo auxílio médico especializado”, comenta Francisco José Mont’Alverne, membro da Sociedade Brasileira de Neurorradiologia (SBNR).
Segundo ele, hoje apenas 30% dos pacientes procuram as instituições de saúde no período de até 8h após o início dos sintomas do AVC. “Como a cada minuto que passa são 2 milhões de neurônios que morrem, imagine os estragos dessa falta de agilidade e as sequelas da doença na vida do paciente?”, questiona.
SUS já poderia oferecer tratamento desde 2021
A Trombectomia Mecânica, na verdade, já deveria estar sendo oferecida no SUS desde 2021, quando teve sua recomendação de incorporação aprovada pela Conitec em 2021, como um tratamento comprovadamente seguro, eficaz e custo-efetivo contra o AVCi, mas a técnica ainda não está disponível para a população. Desde a sua aprovação, em dezembro de 2021 até agora, estima-se que mais de 60.000 pessoas deixaram de ser tratadas e beneficiadas pela TM na rede pública.
O motivo? Para que a sua efetiva operacionalização no sistema público de saúde ocorra, ainda é necessária a publicação do Protocolo Clínico e Diretrizes Terapêuticas (PCDT) pelo Ministério da Saúde. Para mudar essa realidade, a Câmara dos Deputados realiza nesta terça-feira (22/08), às 9h30, audiência pública para tratar da disponibilização de ações de saúde contra o AVC no SUS.
As ações vão desde programas de prevenção, diagnóstico no tempo correto e tratamento, como a tão esperada Trombectomia Mecânica. A sessão contará com a presença de representantes do Ministério da Saúde, Sociedade Brasileira de Cardiologia (SBC), Instituto Lado a Lado pela Vida, a Sociedade Brasileira de AVC e da Sociedade Brasileira de Neurorradiologia Diagnóstica e Terapêutica (SBNR).
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“O AVC deve ser tratado como uma importante questão de saúde pública e, se as instâncias competentes já recomendaram a tecnologia que pode evitar óbitos e dar mais qualidade de vida aos pacientes, ela deveria ser disponibilizada no SUS com agilidade, assim como ocorre aos pacientes que têm acesso à saúde suplementar.”, argumenta Marlene Oliveira, presidente do Instituto Lado a Lado pela Vida.
A audiência pode ser acompanhada pela população via TV Câmara.
Como funciona a Trombectomia Mecânica
A Trombectomia Mecânica consiste na desobstrução da artéria cerebral realizada por um cateter que leva um dispositivo endovascular, um stent ou um sistema de aspiração, para remover o coágulo sanguíneo do cérebro. A técnica reduz as taxas de mortalidade, o tempo de internação e dá mais chances para a boa recuperação no pós-AVC.
- Já aprovada nos Estados Unidos, países da Europa, Canadá
- e Austrália, além de chancelada por guidelines internacionais e sociedades médicas da área, a Trombectomia Mecânica teve eficácia e custo-benefício analisados por nove estudos clínicos. A técnica, no entanto, não havia tido até então a sua viabilidade de implementação evidenciada em um país em desenvolvimento.
- Para atender essa necessidade, surgiu o Resilient, estudo colaborativo da Rede Nacional de Pesquisa em AVC, com financiamento do Ministério da Saúde, realizado em 12 hospitais públicos do país, e com 221 pacientes. A pesquisa foi coordenada pela médica Sheila Martins.
- Com o procedimento, a taxa de recanalização na oclusão de grandes vasos chega a 77%, significativamente mais eficiente que o tratamento convencional de trombólise endovenosa, com 11%. A trombólise endovenosa, tratamento medicamentoso com uso de trombolítico, deve ser aplicado em até 4h30 após os primeiros sintomas.
A TM proporciona também melhor qualidade de vida ao paciente, aumentando a sua capacidade funcional (cognitiva e motora) e dando maior independência no pós-AVC. Estudos apontam ainda que 46% dos pacientes que foram submetidos a essa nova técnica se mostraram independentes após três meses de tratamento, contra apenas 26,5% do grupo que recebeu a trombólise endovenosa (GOYAL, 2016).
Audiência pública na Câmara dos Deputados quer acelerar a implementação de ações de saúde contra o AVC no SUS, como a Trombectomia Mecânica, tratamento que reduz a formação de sequelas nos casos do AVC isquêmico
AVC mata mais de 100 mil brasileiros por ano
O Acidente Vascular Cerebral é a segunda causa de morte e a primeira causa de incapacidade no mundo, de acordo com a World Stroke Organization. O AVC ocorre quando há uma alteração na circulação sanguínea do cérebro. Ele pode ser isquêmico – quando um vaso sanguíneo no cérebro fica bloqueado devido a um coágulo ou trombo – que é o tipo mais comum, correspondendo a 85% dos casos, ou o hemorrágico – quando a artéria se rompe e o sangue extravasa.
O total de óbitos por AVC no Brasil foi de 101.965, em 2019; 102.812, em 2020; e 84.426, de janeiro a 27 de outubro de 2021. Além dos óbitos causados pelo AVC, cerca de 50% dos sobreviventes passam a ter sequelas, que levam à dependência parcial ou total, e até 30% desenvolvem algum tipo de demência nos meses seguintes. Cerca de 70% dos indivíduos que sofrem um AVC não retornam ao trabalho em razão de sequelas da doença. Os idosos continuam a ser o grupo com maior prevalência.
- Entre os sintomas mais comuns do AVC estão perda da força muscular ou formigamento, nos braços ou pernas, principalmente de um lado do corpo, assimetria facial, dificuldade de fala, dificuldade da visão, além de fortes dores de cabeça. Em caso desses sinais, ligue imediatamente para o SAMU 192.