
Ana Carolina Amaral é jornalista formada pela Unesp e mestra em Ciências Holísticas pelo Schumacher College/Plymouth University. Foi repórter ambiental da Folha de S. Paulo e produziu reportagens em 17 países. Cobre as COPs do Clima e outras negociações da diplomacia ambiental desde 2015. É fundadora da The Next Question.
Indígenas munduruku bloqueiam entrada da COP30Imagem: Danilo Verpa/Folhapress
CRÉDITOS: https://www.uol.com.br/ecoa/colunas/ana-carolina-amaral/2025/11/14/cop30-esta-longe-da-implementacao-de-qualquer-coisa-que-salve-o-clima.htm
Muito longe do que gosta de afirmar o governo brasileiro, a COP30 não é a tal COP da implementação. Primeiro, porque isso não lhe compete. Implementar um acordo climático é algo que cabe a governos, ao longo do ano. O segundo motivo é mais grave: mesmo o que já foi acordado em COPs anteriores segue sob suspense.
Embora a COP30 conclua uma década de regulamentação do Acordo de Paris, os países seguem claramente insatisfeitos com o que foi assinado – e especialmente com o que foi cumprido – de lá para cá.
Já foi decidido que os países precisam entregar as suas metas nacionais de clima (as chamadas NDCs, na sigla em inglês para contribuições nacionalmente determinadas). Mas, nove meses depois do prazo, os 115 países que o fizeram, de um total de 197 signatários de Paris, só somam 12% de redução das emissões de gases causadores da crise climática na próxima década – o mundo precisaria derrubar 60% das emissões nesse período.
Uma decisão em cima desse fracasso, mostrado no relatório síntese das NDCs, é uma das demandas que os países trouxeram para a COP30. Habilmente, a presidência da conferência manteve o pleito à parte da agenda adotada para as negociações. Para isso, criou um pacote de quatro itens que se mantêm sob consultas informais até amanhã.
Outro item do pacote contencioso e com potencial para afundar a COP é o financiamento. Ele não está na agenda oficial da COP simplesmente porque já foi aprovado no ano passado, no Azerbaijão.
Os países em desenvolvimento saíram descontentes com o baixo valor – US$ 300 bilhões anuais, muito abaixo do US$ 1,3 trilhão necessário para cumprir as metas climáticas – e, especialmente, com a linguagem frouxa do texto. O compromisso não deixa claro quanto desse dinheiro será doado pelos países ricos, como manda a Convenção do Clima assinada em 1992.
O Brasil – que estaria junto reclamando se não fosse o presidente desta edição da COP – fez de tudo para evitar que a briga por financiamento caísse no seu colo. Se o texto não fosse fechado em Baku, sobraria para Belém. Ao final da conferência por lá, o então chefe da delegação brasileira e futuro presidente da COP30 tirou da cartola uma saída mágica: um relatório com sugestões sobre como levantar o US$1,3 trilhão.
Nascia a Rota Baku-Belém, documento que foi construído ao longo deste ano e lançado às vésperas da COP30, mas que sumiu também num passe de mágica. O Brasil não quis importar a agenda de volta para as negociações climáticas.
O problema é que o ressentimento e a desconfiança entre os blocos de países não são tão fáceis de manobrar quanto a linguagem diplomática. O grupo mais conservador dos países em desenvolvimento, chamado ‘like-minded’ (de pensamento semelhante), exige que o artigo 9.1 do Acordo de Paris, sobre a obrigação dos países ricos de proverem financiamento climático, seja cobrado na COP30.
Não são menos contenciosos os outros dois itens sob consulta presidencial, embora possam parecer técnicos à primeira vista: um é a pendência sobre os relatórios bianuais, que revela uma lacuna de prestação de contas; o outro busca evitar que os países tomem medidas unilaterais (como a taxa de carbono na fronteira, no radar dos europeus), mostrando como os países estão no limite da confiança dentro do multilateralismo.
Meta. Grana. Prestação de contas. Confiança. São essas as cartas do jogo na COP30. Como todas seguem sob consultas informais, não há organizações independentes acompanhando as conversas como observadores e, portanto, há pouca informação (e muito rumor) sobre a temperatura das salas.
O Brasil precisará abrir os microfones na plenária do sábado (15) para permitir que o mundo conheça as posições dos países e que a sociedade civil possa atuar junto aos seus negociadores, revelando os nós e os antagonistas. Sem isso, toda a pressão por resultados ficará em cima da presidência brasileira.
A COP30 está longe da implementação de qualquer coisa que salve o clima. Agora, se o Brasil souber conduzir as conversas difíceis com transparência, pode se salvar de um climão.
Opinião
Texto em que o autor apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretação de fatos e dados.
** Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do UOL.